“Gigante pela própria natureza”: Bracell transforma indústria de celulose com o Projeto Star
A fábrica em Lençóis Paulista (SP) é a maior e mais verde do setor, com flexibilidade para produzir celulose kraft e solúvel
Em setembro de 2021, a Bracell iniciou a maior e mais sustentável fábrica de celulose do mundo, denominada Projeto Star. Localizado em Lençóis Paulista (SP), o empreendimento é um marco significativo na história do setor, não apenas por suas dimensões – os aportes ultrapassam R$ 15 bilhões, com capacidade de produção de 1,5 milhão de toneladas de celulose solúvel ou até 3 milhões de toneladas de celulose kraft anuais – como também pela jornada de materializar uma ideia revolucionadora em resultados sólidos.
Com início em julho de 2019, o projeto levou 25 meses e 25 dias até sua conclusão, desde a primeira movimentação de terra até o seu start-up, e teve que enfrentar um grande desafio ainda na primeira fase. No verão de 2020, o nível das chuvas fez com que as obras fossem paralisadas em alguns momentos, por razões de segurança – naquele mês de fevereiro, a primeira semana teve um volume de chuvas equivalente a 60% do esperado para o mês. Foi necessário aplicar uma cobertura de britas em toda a extensão para ajudar na contensão de água e possibilitar o acesso.
Era apenas o início de um ano complexo e marcante para a história da humanidade, que mudou a forma como o projeto foi realizado, trazendo à tona a resiliência e inovação da companhia.
MEGAOPERAÇÃO EM MEIO À PANDEMIA
Um projeto das proporções do Projeto Star já é extremamente desafiador para qualquer companhia. Como um teste – e uma validação – de seu comprometimento com o futuro da indústria, a Bracell ainda teve de lidar com uma pandemia global enquanto as obras avançavam.
“Nós tínhamos duas opções: ou desistíamos e fazíamos com que as pessoas retornassem para suas cidades e retomávamos o projeto posteriormente, ou enfrentávamos o problema de frente e dávamos condição a essas pessoas de estarem melhor conosco do que estariam em suas casas. Nós fizemos a segunda opção”, afirmou Pedro Stefanini, o então diretor-geral da Bracell em São Paulo.
Nesse sentido, a companhia adotou as medidas sanitárias necessárias para segurança dos trabalhadores. No pico das obras, em agosto de 2021, o número de colaboradores superou 14 mil pessoas, de diversas empresas parceiras. Vale ressaltar que, além de instituir protocolos de biossegurança, a companhia ampliou a estrutura do ambulatório no canteiro de obras com mais equipes médicas e novos equipamento, e garantiu aos trabalhadores um plano de saúde obrigatório, visando agilidade nos atendimentos sem onerar as estruturas públicas de atendimento na cidade.
Mas os desafios em meio à pandemia de Covid-19 eram inúmeros. Houve ainda atrasos nas entregas de equipamentos importados, que obrigaram a empresa a acelerar a construção civil, que não dependia desses equipamentos, bem como as montagens eletromecânicas industriais. O plano era antecipar algumas etapas para não quebrar os prazos.
A resiliência do time Bracell se tornou um case dentro do Grupo Royal Golden Eagle (RGE), do qual a Bracell faz parte. O modelo adotado no gerenciamento da obra (engineering, procurement and construction contracts – EPC) passou a ser replicado nos demais empreendimentos do grupo asiático.
A FÁBRICA MAIS VERDE DO SETOR
O Projeto Star já era ambicioso por sua grandeza, porém a Bracell ainda tinha o objetivo de ser green, investindo em tecnologias focadas em reduzir os impactos ambientais e tornar a produção ainda mais sustentável, materializando o que há décadas era uma utopia. Dessa forma, ganhou forma a fábrica de nova geração na qual os processos obedecem às diretrizes de menor impacto possível no ambiente, bem como na comunidade de sua influência.
“Ser grande é bom, mas ser grande e sustentável é ainda melhor” – Anderson Tanoto, diretor executivo da RGE.
Essa preocupação remonta desde a plantação do eucalipto, principal insumo da companhia. As árvores plantadas para a produção de celulose foram cultivadas em áreas que anteriormente eram ocupadas por pastagens ou estavam degradadas, auxiliando a absorver o dióxido de carbono da atmosfera.
A empresa também adota o uso racional da água, incluindo um sistema terciário de efluentes para sólidos finos, uma proteção extra ao rio que não está prevista nas leis ambientais. Algumas das iniciativas nessa frente incluem monitoramento constante da água, ações para reduzir esse consumo, programa de conscientização de colaboradores e inspeções para detectar possíveis vazamentos nas tubulações.
Somado a técnicas modernas para o máximo reaproveitamento de água, o resultado dessas iniciativas é um dos menores consumos de água por tonelada de celulose produzida, de 18 metros cúbicos – e a maior parte devolvida ao Rio Tietê, com consumo real de 0,3 metros cúbicos.
Além disso, a companhia foca na geração e distribuição de energia elétrica limpa para as operações da unidade, sendo a primeira fábrica de celulose do Brasil conectada ao Sistema Interligado Nacional (SIN), no nível de tensão de 440 quilovolts. Isso graças à construção de uma subestação conectada à rede de transmissão com tecnologia GIS (Gás Insuflado).
A capacidade instalada é de 420 MW, movidos por três turbogeradores capazes de atender a demanda da fábrica e possibilitar a exportação para a rede SIN de cerca de 150 MW a 180 MW excedentes de energia de fontes renováveis, sem emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE), suficientes para atender 750.000 residências ou cerca de três milhões de pessoas.
A MAIOR E MAIS LIMPA CALDEIRA DE RECUPERAÇÃO DO MUNDO
A caldeira de recuperação é a responsável pela principal inovação do Projeto Star – sua flexibilidade entre as linhas de celulose solúvel e celulose kraft. Com 30 metros de comprimento, é a maior do mundo em operação, além de garantir uma operação sustentável ao reaproveitar matéria-prima para geração de energia elétrica. Considerada a estrela do espetáculo, representa uma das superações tecnológicas do projeto.
Sua complexidade construtiva e operacional exigiu precisão e perfeita sincronia para garantir a performance esperada, sendo um dos principais desafios técnicos e de inovação nas fases do processo de construção.
Possui capacidade de queimar 13 mil toneladas de sólidos secos por dia, produzindo 2 mil toneladas de vapor por hora – uma capacidade produtiva 40% maior que as caldeiras convencionais.
A chegada e o içamento do steam drum, o balão de vapor da caldeira de recuperação, foi um capítulo à parte em toda a trajetória do Projeto Star, exigindo ineditismo, além de precisão em movimentos milimétricos de superguindastes. Com contratempos no cronograma de montagem e entrega do balão, havia risco de atraso nas obras.
Contudo, a equipe da Bracell inverteu a ordem, em uma ação inédita, e fariam primeiro a caldeira, só depois instalando o balão. Com 310 toneladas e 30 metros de comprimento, o balão veio diretamente da Espanha, desembarcando no Porto de Santos e superando o desafio logístico de enfrentar serras e rodovias com curvas fechadas desde o litoral até Lençóis Paulista.
Ao chegar, o desafio era instalar o balão a uma altura de 94 metros, com a caldeira já construída. O “dia D” ocorreu duas semanas depois, na madrugada, devido a menor incidência de ventos. A preparação incluiu compactar os terrenos e adicionar placas de aço de duas polegadas para garantir que os guindastes não afundariam com o peso dos equipamentos. Cada guindaste suportava içar 750 e 800 toneladas cada.
Em meio à tensão desse movimento inédito, a precisão e sincronia dos braços mecânicos, a fim de evitar sobrecarga em um dos lados, em movimentos lentos e milimétricos. Os operadores foram guiados por técnicos do alto da estrutura e no chão, via rádio.
O balão foi posicionado a 100 metros de altura, com espaço para manobra para ajustes de apenas 20 centímetros. Levou sete horas, mas o procedimento teve êxito.
NÚMEROS
- Foram mais de R$ 15 bilhões aplicados na construção da Bracell de Lençóis Paulista, o maior investimento privado no Estado de São Paulo nos últimos 20 anos;
- Mais de 20.000 estacas de hélice contínua estavam previstas no projeto, porém não havia perfuratrizes disponíveis no Brasil para completar o trabalho, sendo necessário utilizar estacas pré-moldadas;
- 5,5 km de pipe rack do BOP (Balance of Plant) foram instalados na fábrica. Essa dimensão está distribuída em 166 módulos, com o mais pesado tendo 165 toneladas;
- 13.000 toneladas de sólidos secos é a capacidade diária de queima da caldeira de recuperação, o que gera 2.000 toneladas de vapor por hora;
- A chaminé possui 144 metros de altura, que equivalem a um edifício de 30 andares;
- 68 quilômetros de tubulações foram instalados da fábrica até o Rio Tietê, para captação de água e emissão de efluentes;
- 14.766 trabalhadores foram registrados no ápice da mobilização do Projeto Star;
- Até 180 Mw representam o excedente de energia produzido pela nova fábrica, que são disponibilizados no sistema nacional por meio da subestação SE -440Kv;
- 750 mil residências ou 3 milhões de pessoas podem ser atendidas com esse excedente de energia verde.
LIVRO E DOCUMENTÁRIO
Outros detalhes do Projeto Star estão disponíveis para o público por meio do livro lançado pela companhia e no documentário disponível no Discovery+.
NOVA FÁBRICA EM MATO GROSSO DO SUL
O Projeto Star é um marco para a Bracell, mas seu crescimento no país segue a todo vapor. Recentemente, a companhia anunciou o interesse de construir uma nova fábrica de celulose em Mato Grosso do Sul, com investimentos entre R$ 20 e R$ 25 bilhões. Segundo Jaime Verruck, secretário da Semadesc (Secretaria de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação), a unidade deve ter uma capacidade produtiva de 2,8 milhões de toneladas de celulose.
A empresa já solicitou o termo de referência para realizar o EIA/Rima (Estudo de Impacto Ambiental e Relatório Impacto do Meio Ambiente) para se instalar em uma área localizada a 15 quilômetros do perímetro urbano de Água Clara.